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Relato sobre o 4º Seminário Perspectivas Críticas sobre o Trabalho no Turismo

Bianca Briguglio & Renan Conceição | Labor Movens



Entre os dias 31 de agosto e 3 de setembro, realizou-se na Universidade de Brasília (UnB) o 4º Seminário Perspectivas Críticas do Trabalho no Turismo, organizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Condições de Trabalho no Turismo - Labor Movens. O tema do evento deste ano foi “Outro Trabalho no Turismo É Possível”, demonstrando o desenvolvimento e avanços do pensamento sobre o trabalho no turismo realizado pelo Labor Movens, uma vez que, nos seminários anteriores, os temas ainda refletiam questionamentos sobre o futuro do trabalho.


Este seminário foi realizado presencialmente pela primeira vez, após três edições virtuais, nas quais pesquisadores, estudantes, pós graduandos e professores de todas as regiões do país apresentaram suas pesquisas, questionamentos e inquietações sobre o turismo a partir de um viés que privilegia o trabalho como ponto de partida e de análise.


A realização presencial deste seminário só foi possível devido ao esforço e trabalho concretizados por muitas mãos. Ou melhor, muitas mãos, pernas, mentes e corações. Este seminário é resultado da persistência e determinação contumazes dos participantes, que atuaram em diversas frentes para viabilizar este evento. Seja discutindo um tema, montando a programação, prospectando convidados e palestrantes, organizando grupos de trabalho, seja elaborando projetos para reivindicar recursos, buscando patrocinadores e diversas fontes de financiamento, seja mantendo a cabeça fria diante das negativas e dos obstáculos, este 4º Seminário coroa um esforço coletivo que se realizou ao longo de muitos meses. É também resultado da resistência de um grupo que se iniciou no período da pandemia de Covid-19 e conseguiu se manter ativo e relevante mesmo com o retorno às atividades presenciais de todos os seus membros.


Acervo do Labor Movens


O Seminário presencial é um momento fundamental de troca de experiências e estreitamento de laços, sobretudo de pessoas que conversam, debatem e estudam juntas há alguns anos, e que nunca haviam tido a oportunidade de se encontrarem pessoalmente. Por isso todo esforço valeria a pena, por isso tantas mãos estavam comprometidas em fazê-lo acontecer. O seminário presencial, para o Labor Movens, que pode ser considerado um grupo de pesquisa contra-hegemônico nos estudos em turismo, foi o momento de se reconhecer também como um grupo capilarizado nacionalmente.


O evento foi realizado no Centro de Excelência do Turismo (CET) da UnB, que acolheu os participantes e os recebeu de braços abertos. O evento também fez parte da celebração dos 25 anos do CET. A própria equipe, professores, estudantes e funcionários, engajaram-se para que o Seminário ocorresse de forma organizada. Esta edição contou com participantes de todos os cantos do Brasil. Estudantes, professores, pesquisadores, trabalhadores de hotéis, guias de turismo, pessoas de comunidades quilombolas, sindicalistas e muitos outros profissionais de Norte a Sul do país estiveram presentes nas Mesas Redondas e nos Grupos de Trabalho.


Os trabalhos apresentados nos GTs reforçaram a importância da existência de um espaço crítico, onde pesquisadores das mais variadas formações e níveis puderam conversar e debater assuntos que, muitas vezes, não são fáceis e de simples discussão. Importante destacar que alguns dos GTs foram realizados em formato de roda de conversa, o que propiciou participação ampla, privilegiando as discussões e incitando até mesmo as pessoas que foram apenas assistir a participarem do debate. O formato se mostrou um grande acerto, pois permitiu que todos pudessem se olhar durante as interações, quebrando o academicismo tradicional das apresentações de trabalhos.


Acervo do Labor Movens


Durante os dias do seminário, houve intensa participação durante as mesas de conversa propostas. Ainda que o número de participantes tenha variado de um dia para o outro, entre 40 e 120 pessoas assistiram às palestras e Mesas Redondas nestes três dias. Importante destacar a grande participação das plateias ao longo desses dias de evento. Os assuntos debatidos pelos convidados e palestrantes propiciou conversas que se estenderam aos momentos de confraternização após o evento, permitindo o começo de novos contatos e novas redes de pesquisa. Temas como sindicalismo e formas de combate ao discurso antissindical, abordados no primeiro dia de evento; turismo e promoção da saúde, temas do segundo dia; e turismo em territórios de resistência, presente no terceiro dia, foram muito comentados e permaneceram na memória para a realização das vivências turísticas do quarto e último dia.


Acervo do Labor Movens


Para além das atividades “formais” (apresentações, debates, palestras), a organização do Seminário, coerente com a reivindicação dos trabalhadores do turismo pelo direito ao lazer, promoveu também as confraternizações que ocorreram fora da Universidade. No primeiro dia, todos os participantes foram convidados a ir ao Armazém do Campo, o espaço que comercializa produtos da Reforma Agrária, ligado ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). O músico Marcelo Café, cantor e compositor de samba e produtor cultural, aguardava os participantes, cantando sambas e outras canções da música popular brasileira. No segundo dia, os participantes foram ao bar chamado Aquilombar, uma proposta afrocentrada inspirada nos quilombos, com imagens e ícones do movimento negro. Por fim, no terceiro dia, os participantes foram ao Pardim, um tradicional boteco progressista que recebe a esquerda brasiliense.


Pode parecer que a confraternização pós-evento é algo menos importante ou dispensável, mas nada está mais distante da realidade. A “conversa de boteco” é fundamental para aprofundamento e apropriação dos debates que ocorreram durante o dia, o que de fato ocorreu. Participantes e palestrantes puderam se conhecer melhor, dar prosseguimento às temáticas abordadas e ainda formar uma comunidade mais próxima. A união de pessoas tão diversas e vindas de todas as regiões brasileiras em um mesmo local de entretenimento permitiu um senso de comunidade que um evento virtual ou de temática mais ampla dificilmente conseguiria emular. É na intersecção entre teoria e prática que os conceitos abordados, as ideias expostas e as temáticas debatidas ganham empirismo e passam a ser apropriadas com mais segurança. E a realização dos encontros pós evento permitiram esse espaço de intersecção.


Acervo do Labor Movens


A Conferência de Encerramento do 4º Seminário contou com a presença de Ernest Cañada, pesquisador do turismo em nível de pós-doutorado da Universidade das Ilhas Baleares (UIB) da Espanha e membro fundador da Alba Sud, uma associação de pesquisa com sede em Barcelona, da qual o Labor Movens é parceiro. Em companhia de Ernest, estava Marutschka Moesch, professora do CET/UnB e uma das grandes pesquisadoras do turismo no Brasil. O tema da conferência foi a possibilidade de um turismo pós-capitalista, em que Ernest apresentou uma síntese do conceito que vem sendo desenvolvido no âmbito da Alba Sud, instigando os participantes presentes a pensar nas possibilidades de um turismo que ocorra fora dos marcos capitalistas atuais.


Acervo do Labor Movens


A Mesa de Encerramento do Seminário trouxe a leitura do Manifesto Por Um Outro Trabalho no Turismo, escrito por participantes do grupo Labor Movens, inspirados pelo Fórum Social Mundial e pelos objetivos da Agenda 2030 e pela plataforma Transforming Tourism, no qual realizou-se um chamado à ação, para que os trabalhadores do turismo participem da política, façam a política, atuem para transformar a realidade, de um ponto de vista crítico.


No último dia do evento, o Labor Movens oportunizou aos participantes uma visita técnica dentre duas possíveis, que aconteceram concomitantemente. Ambos os passeios foram capitaneados por ex-alunas do curso de Turismo do CET/ UnB. O tour “Brasília Negra”, guiado e idealizado por Bianca D'Aya a partir de sua pesquisa sobre a história negra de Brasília, procura mostrar a presença negra na cidade, revelando espaços e monumentos que não aparecem dentre os pontos turísticos mais famosos, assim como a importância dos trabalhadores e trabalhadoras negros em sua construção.


Acervo do Labor Movens


A visita “Sebas Turística”, uma iniciativa de turismo comunitário afrocentrado na Região Administrativa de São Sebastião, dentro dos perímetros do Distrito Federal, foi conduzida por Aline Karina e Quezia. Os participantes conheceram uma olaria do tempo da construção da cidade, que segue produzindo tijolos até os dias de hoje, e uma horta comunitária instalada sobre um antigo lixão, que hoje abastece outras comunidades do entorno.


Acervo do Labor Movens


Essas visitas técnicas, além de promoverem a possibilidade de desfrutar o turismo e conhecerem também uma face pouco vista do território no qual se realizou o evento, também proporcionaram aos participantes a oportunidade de refletir e experimentar tudo que foi discutido no Seminário na prática, aprofundando o questionamento sobre um outro turismo possível.


O 4º Seminário do Labor Movens, por fim, apresentou o crescimento dos estudos críticos sobre o trabalho no turismo, consolidando-se como um evento essencial para a evolução do pensamento turístico brasileiro. A migração de uma plataforma inicialmente virtual para um encontro presencial representou um grande desafio em relação ao público esperado e à participação nas mesas e atividades programadas. Com grande sucesso, o seminário demonstrou que a existência deste espaço propício para o debate aprofundado de temas sobre a atividade turística e o encontro de pesquisadores e trabalhadores da área possibilita uma atuação futura mais embasada teoricamente, colocando em prática, pelos participantes do evento, olhares mais críticos.

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